O Senado optou por adiar, para terça-feira (20), a votação do projeto que prevê medidas de compensação para a desoneração da folha de pagamentos. O líder do governo na Casa e relator do projeto, Jaques Wagner (PT-BA), apresentou seu parecer, nesta quinta-feira, abrindo prazo para acatar sugestões e “aproximar o texto” das demandas dos parlamentares.
O relatório incluiu um dispositivo controverso, que aumenta a cobrança incidente nos Juros sobre Capital Próprio (JCP), de 15% para 20%, com o objetivo de repor a perda de R$ 25 bilhões dos cofres da União este ano, com a prorrogação da desoneração.
“Estou me comprometendo a negociar até segunda-feira, pois são muitas emendas e destaques chegando, e tentar ao máximo incorporar o que for possível ao texto. Sei quais são os questionamentos, alguns irão para destaque, mas o voto decidirá como seguiremos em frente”, disse Wagner. Ele reconheceu que a medida deve gerar insatisfação entre os senadores.
O projeto propõe pelo menos outras sete fontes de compensação. De acordo com o líder, esse aumento do JCP só passaria a ser cobrado em janeiro de 2025, caso as outras medidas não fossem capazes de repor as perdas. “Sei que cria desconforto, ninguém gosta de falar de aumento de juros ou contribuição. Agora, insisto que, nesta Casa, há a lei de responsabilidade fiscal”, enfatizou.
Os Juros sobre Capital Próprio são um tipo de remuneração que as empresas distribuem aos seus acionistas, sócios ou cotistas. Na prática, é uma forma de distribuição de lucros alternativa aos dividendos. Foi criada para substituir o desconto da correção monetária na apuração do lucro real e, consequentemente, na base de cálculo de impostos.
A sugestão do incremento foi feita pela equipe econômica, conforme explicou o relator. “Alguns deles (dispositivos de compensação), como atualização de ativos, têm um cálculo difícil de se fazer, pois depende de adesão”, ressaltou Wagner. “A Receita e a Fazenda discutiram muito um aumento do CSLL (Contribuição Social sobre o Lucro Líquido), mas a rejeição foi latente, e este relator foi buscar um encontro de contas. Decidimos então trabalhar em algo que já tem seus questionamentos, que é o JCP”, emendou.
Em nota, a Associação Brasileira das Companhias Abertas (Abrasca) criticou a proposta e afirmou que o aumento da tributação do JCP é um “equívoco”. “Essa medida ainda tende a piorar o mercado e o cenário de investimentos no Brasil, que já conta com um dos piores indicadores de desempenho ao redor do mundo, além de agravar as várias distorções já existentes na tributação sobre a renda”, alegou.
A entidade reúne empresas com 40% de participação no Produto Interno Bruto (PIB) do país e responde por 80% do valor de mercado das empresas listadas na B3. “A Abrasca acredita que o equilíbrio fiscal deve ser justo do ponto de vista social e garantir a competitividade das empresas brasileiras. O caminho para alcançar esse equilíbrio é a melhor utilização de recursos e ativos públicos, a redução de gastos sem afetar os mais pobres e uma profunda revisão do orçamento federal, para permitir a melhor alocação de recursos e o controle social”, enfatizou a associação.
Outra medida de compensação prevista no parecer do relator, proposta pela Receita, é um pente-fino no Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) e no Benefício de Prestação Continuada (BPC). Conforme o Ministério da Previdência, o governo avalia economizar R$ 20 bilhões na revisão dos benefícios previdenciários.
Além disso, o texto propõe a atualização de bens no Imposto de Renda, repatriação de ativos mantidos no exterior, renegociação de multas aplicadas por agências reguladoras, uso de depósitos judiciais e extrajudiciais, além do programa de cadastro dos benefícios fiscais concedidos pelo governo e o uso de recursos esquecidos.
A reoneração da folha de pagamentos das empresas ocorrerá de 2025 a 2027, com o aumento gradual das alíquotas da contribuição previdenciária e a redução gradual das alíquotas da contribuição sobre a receita bruta.
Um ponto importante do substitutivo apresentado é a reoneração gradual também dos municípios menores, contemplados pela redução da alíquota da contribuição previdenciária de 20% para 8%. Nesse caso, a alíquota subirá para 12%, em 2025; 16%, em 2026; e 20%, em 2027. Analistas consultados pelo Correio consideram o dispositivo de difícil aprovação.
A implementação das mudanças pode propiciar recursos para a União, mas não há como saber ao certo qual o impacto e como seria distribuído ao longo do tempo. “O principal problema é 2024, com uma renúncia estimada em R$ 25 bilhões, dada a vigência plena da desoneração e mais da metade do ano já transcorrido. Nos anos seguintes, a renúncia será menor, em vista da reoneração gradual”, apontou Felipe Salto, economista-chefe da Warren Investimentos.
Salto disse não acreditar que seja possível arrecadar um montante relevante de recursos ainda em 2024. “A meta fiscal terá que ser alcançada com cortes de despesa, mesmo com o desempenho muito bom da receita”, alertou. “Nos demais anos, especialmente em 2025, os recursos propiciados pelas mudanças poderão ajudar a substituir fontes não recorrentes que contribuíram para a arrecadação, em 2024”, acrescentou.
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