Aumento do Juros sobre Capital Próprio encontra resistência no Senado

O Senado deve retomar, nesta terça-feira (20/8), as discussões das medidas de compensação da desoneração da folha de pagamentos. Na semana passada, o líder do governo no Senado e relator do projeto, Jaques Wagner (PT-BA), apresentou um novo parecer em que sugere o aumento da cobrança incidente nos Juros sobre Capital Próprio (JCP) de 15% para 20%, para repor a perda dos cofres da União e a prorrogação do benefício tributário.

“Estou me comprometendo a negociar até segunda-feira (hoje), pois são muitas emendas e destaques chegando, e tentar ao máximo incorporar o que for possível ao texto. Sei quais são os questionamentos, alguns irão para destaque, mas o voto decidirá como seguiremos em frente”, disse Wagner, na última quinta-feira (15).

O projeto chegou a ser colocado em pauta no plenário, mas acabou adiado devido à falta de consenso sobre o texto. Líderes partidários resistem à ideia, sob o argumento contrário a qualquer aumento de tributo.

Os Juros sobre Capital Próprio são uma forma de remuneração oferecida por empresas de capital aberto a seus acionistas, cotistas e sócios. Trata-se de uma alternativa ao pagamento de dividendos, que são isentos de tributação, pois o JCP já é sujeito à incidência de 15% de Imposto de Renda.

De acordo com o relator, a elevação para 20% trata-se de uma “dispositivo de garantia” financeira, caso outras medidas de compensação não sejam suficientes para cobrir a renúncia fiscal decorrente da desoneração, estimada em R$ 25 bilhões em 2024. “Eu sei que cria desconforto, ninguém gosta de falar de aumento de juros ou contribuição”, ponderou Jaques Wagner, que assumiu ser ele mesmo um dos afetados pela revisão da alíquota.

A proposta não surge sem precedentes. O aumento do JCP foi uma sugestão do Ministério da Fazenda como alternativa para substituir o aumento de 1 ponto percentual na alíquota da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL), que também enfrentou forte rejeição entre os senadores.

Ao todo, o projeto contempla sete medidas de compensação, incluindo a atualização de ativos. A sugestão do JCP foi feita pela equipe econômica, conforme explicou o relator. “Alguns deles (dispositivos de compensação), como atualização de ativos, têm um cálculo difícil de se fazer, pois dependem de adesão”, disse Jaques.

Um dos objetivos da medida é desestimular o uso do instrumento, que é malvisto pela equipe econômica do governo, por ser, muitas vezes, usado como forma de reduzir o pagamento de tributos. No ano passado, a pasta comandada por Fernando Haddad chegou a cogitar a extinção completa do JCP.

Um extenso lobby de entidades do setor produtivo vem pressionando os congressistas, nos últimos dias, pela rejeição do trecho, sob o argumento de que mudanças podem gerar insegurança jurídica e prejudicar de forma significativa os investimentos das empresas. “O setor de telecomunicações entende que o JCP deve ser analisado dentro de um contexto mais amplo de reforma dos tributos da renda”, frisou Marcos Ferrari, presidente da Conexis.

O projeto prevê a reoneração gradual da folha de pagamentos de 17 setores da economia, bem como mantém a desoneração integral neste ano e estabelece a retomada gradual da tributação sobre a folha de pagamento entre 2025 e 2027.

Outro ponto do texto despertou insatisfação e é também motivo de pressão por parte do empresariado. O artigo 4 do projeto estabelece que somente terão direito à alíquota diferenciada da contribuição previdenciária patronal, entre 1º de janeiro de 2025 e 31 de dezembro de 2027, as empresas que se comprometerem a manter quantitativo de funcionários igual ou superior ao verificado no início de cada ano-calendário.

A presidente da Federação Nacional de Call Center, Instalação e Manutenção de Infraestrutura de Redes de Telecomunicações (Feninfra), Vivien Mello Suruagy, considerou a condição “absurda”. “Tal exigência de manutenção fere de morte a desoneração, pois ninguém, de modo responsável e sério, pode assumir um compromisso como esse. São muitas as variáveis econômicas, nacionais e internacionais, além das tecnológicas, que podem interferir no mercado de trabalho”, alegou.

Há um ceticismo entre os tributaristas sobre a possibilidade de que a alternativa do JCP prospere. Além disso, existe um consenso de que não será possível arrecadar um montante relevante de recursos ainda em 2024. “É de conhecimento de todos que as medidas apresentadas pelo Senado para a compensação da desoneração estão longe do suficiente para possibilitar a efetiva compensação dos valores frustrados”, afirmou o economista Murilo Viana, consultor sênior da GO Associados.

Ele mencionou uma nota técnica divulgada pela Instituição Fiscal Independente (IFI), órgão vinculado ao Senado, indicando que as medidas de compensação propostas dão conta de compensar menos de 40% da perda de receita em 2024, com piora no percentual para 2025 e 2026. “O governo tentou emplacar uma mudança na tributação da CSLL, e, mais recentemente, no JCP. O Senado, por sua vez, não tem mostrado disposição para esse tipo de compensação”, frisou.

Entre outras medidas de compensação previstas, estão um pente-fino no Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) e no Benefício de Prestação Continuada (BPC). Viana demonstrou preocupação com o trecho. Segundo ele, “a efetiva dimensão potencial de tal economia é pouco conhecida”. Além disso, “usar tal economia como justificativa de compensação não melhora do ponto de vista líquido a situação fiscal”, reforçou o consultor.

O Supremo Tribunal Federal (STF) estabeleceu como prazo até 11 de setembro para que o Executivo e o Legislativo encontrem uma solução consensual sobre o tema. O líder do governo no Senado e relator da matéria declarou que fará o possível para acatar o maior número de emendas ao texto, para diminuir a resistência ao projeto.

Diante do fogo cruzado, o diretor adjunto da Comissão de Direito Tributário da OAB/GO, Guilherme Di Ferreira, apontou que o consumidor acaba pagando pela insegurança jurídica das empresas, que enfrentam dúvidas sobre o panorama da cobrança. “É o consumidor final que acaba tendo a prestação de serviço ou o produto por um valor elevado. Essa incerteza sobre a cobrança de tributos acaba sendo repassada pelas empresas”, destacou.

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